(in Memoriam)
Por Nelson Antonio Pirola
Escrever sobre a professora doutora Márcia Regina Ferreira de Brito é, para mim, uma honra muito grande por dois grandes motivos: primeiro, porque a professora Márcia Brito, como carinhosamente a chamávamos, fez parte de minha formação desde a graduação até a pós-graduação. Quando fiz a licenciatura em Matemática, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), tive o privilégio de ter aulas de Psicologia da Educação: Aprendizagem com ela. Foi essa disciplina que me despertou o interesse pela área da Psicologia da Educação Matemática. A partir daí, a professora Márcia me acompanhou, como orientadora, no mestrado e no doutorado, na Faculdade de Educação da Unicamp. O segundo motivo que muito me honra em escrever sobre a professora Márcia Brito é pelo legado que nos deixou em termos de pesquisas no campo da Educação Matemática e, em especial, no campo da teoria social cognitiva (TSC).
Dados biográficos
Márcia Regina Ferreira de Brito, uma grande pesquisadora do campo de investigação em Educação Matemática, era graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC Campinas) (1973), mestra em Educação (área de concentração em Psicologia Educacional) pela Unicamp (1977) e doutora em Educação (área de Psicologia da Educação) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)(1984).
Trajetória profissional
Foi docente do Departamento de Psicologia Educacional da Faculdade de Educação da Unicamp de 1974 a 2018, instituição na qual recebeu o título de livre-docente em 1996 e de professora titular em 2001. Em 1986, criou o Grupo de Pesquisa em Psicologia da Educação Matemática (PSIEM) na Faculdade de Educação da Unicamp, alavancando as produções de conhecimento nessa área, tendo orientado dezenas de teses e dissertações.
Márcia Brito deixou um legado importante em termos de produção científica no campo da Psicologia da Educação Matemática. Na década de 1990, foi uma das responsáveis pela criação do Grupo de Trabalho em Psicologia da Educação Matemática, junto à Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia (ANPEPP), grupo que permanece vivo e atuante até hoje. A sua tese de livre-docência (Brito, 1996), intitulada “Um estudo sobre as atitudes em relação à Matemática em estudantes de 1o e 2o graus”, defendida em 1996, foi um marco nos estudos sobre a afetividade dos alunos em relação à Matemática. A partir dessa tese, a professora Márcia Brito se enveredou por outras temáticas relacionadas com os aspectos afetivos e motivacionais em relação à Matemática. Foi nesse momento que intensificou seus estudos e pesquisas no contexto da teoria social cognitiva, levando para o campo da Educação Matemática pesquisas sobre crenças de autoeficácia. O primeiro trabalho orientado com essa vertente foi a dissertação de mestrado de Liliane Ferreira das Neves, (Neves, 2002) intitulada “Um estudo sobre as relações entre a percepção e as expectativas dos professores e dos alunos e o desempenho em matemática”, defendida em 2002. Nesse estudo, foram investigadas relações entre autoeficácia e desempenho e relações entre autopercepção e expectativas de desempenho, tendo como participantes alunos de terceiro e quarto anos do Ensino Fundamental. A dissertação de Liliane Neves serviu como ponto inicial para que o PSIEM pudesse avançar nas discussões sobre as relações das crenças de autoeficácia com o desempenho em Matemática. Embora sua primeira orientação na vertente da TSC seja de 2002, seus estudos sobre essa teoria datam de muito antes. Em um artigo publicado em 2011, intitulado “Psicologia da Educação Matemática: um ponto de vista”, Márcia Brito destaca que: “[…] no final da década de oitenta, a partir da leitura dos trabalhos de Albert Bandura, comecei a me interessar pela teoria social cognitiva e iniciei um projeto a respeito das atitudes em relação à Matemática” (Brito, 2011, p. 33).
A partir da dissertação de mestrado de Liliane das Neves, a professora Márcia desenvolveu outras pesquisas no contexto da TSC, abarcando estudos que relacionavam as crenças de autoeficácia em Matemática com atitudes, desempenho, autoconceito e solução de problemas. Entre esses trabalhos destacamos os de Dobarro e Brito (2010), Souza e Brito (2008), Brito e Souza (2015) e Loos-Sant’Ana e Brito (2017).
O desejo da professora Márcia era intensificar suas pesquisas no campo das crenças de autoeficácia em relação à Matemática, entretanto isso não foi possível em decorrência de seu falecimento em 2018. As pesquisas desenvolvidas pela professora Márcia Brito em conjunto com seus colaboradores trouxeram, de forma significativa, contribuições da TSC para a área da Educação Matemática. Atualmente, o Grupo de Pesquisa em Psicologia da Educação Matemática (GPPEM) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), campus Bauru, tem dado continuidade aos estudos sobre crenças de autoeficácia na Matemática iniciados pela professora Márcia.
Em 2017, foi realizado, em Bauru, São Paulo, o I Seminário de Pesquisa em Psicologia da Educação Matemática. Nesse evento, organizado pelo professor Nelson Pirola, docente do Departamento de Educação da Faculdade de Ciências da Unesp-Bauru, a professora Márcia recebeu uma linda homenagem pelas significativas contribuições dadas ao campo de investigação em Educação Matemática. O evento foi transmitido pela TV Unesp e contou com a participação da diretoria da Faculdade de Ciências da Unesp-Bauru. O evento pode ser acessado pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=DAziBB5ODtg&t=28s.
A professora Márcia Brito, a partir de sua produção científica, abriu caminhos e outros olhares para a compreensão das relações entre as crenças de autoeficácia e a aprendizagem da Matemática escolar.
Referências
BRITO, M. R. F. Um estudo sobre as atitudes em relação à Matemática em estudantes de 1º e 2º graus. Tese (Livre-docência). Faculdade de Educação – Universidade Estadual de Campinas, Campinas,1996. Disponível em:
https://www.repositorio.unicamp.br/acervo/detalhe/175862?guid=1749572032200&returnUrl=%2fresultado%2flistar%3fguid%3d1749572032200%26quantidadePaginas%3d1%26codigoRegistro%3d175862%23175862&i=1. Acesso em: 6 jun. 2025.
BRITO, M. R. F..; SOUZA, L. F. N. I. Autoeficácia na solução de problemas matemáticos e variáveis relacionadas. Temas em Psicologia (Ribeirão Preto), v. 23, nº1, p. 29-47, 2015. Disponível em: https://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-389X2015000100004 Acesso em: 6 de jun. 2025.
BRITO, M. R. F. Psicologia da educação matemática: um ponto de vista. Educar em Revista (Impresso), v. 1, p. 29-45, 2011. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/educar/article/view/22594. Acesso em: 10 jun. 2025.
DOBARRO, V. R.; BRITO, M. R. F. Atitude e crença de autoeficácia: Relação com o desempenho em Matemática. Educação Matemática Pesquisa (impresso), v. 12, n. 2, p. 199-220, 2010. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/emp/article/view/2180. Acesso: em 6 jun. 2025.
LOOS-SANT’ANA, H.; BRITO, M. R. F. Atitude e Desempenho em Matemática, Crenças Autorreferenciadas e Família: uma path-analysis. Bolema (Rio Claro), v. 31, nº 58, p. 590-613, 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/j/bolema/a/ywGLhJGvSHmDmbmPkY5t4Rx/. Acesso em: 6 jun. 2025.
SOUZA, L. F. N. I.; BRITO, M. R. F. Crenças de auto-eficácia, autoconceito e desempenho em matemática. Estudos de Psicologia (PUCCAMP. Impresso), v. 25, nº 2, p. 193-201, 2008. Doi: https://doi.org/10.1590/S0103-166X2008000200004. Acesso em: 6 jun. 2025.